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Se o problema fosse essa distribuição dos royalties do petróleo na forma da Emenda Ibsen Pinheiro, não teríamos problema. Essa mudança, ferindo atos jurídicos consolidados, direitos adquiridos, não resiste a uma apreciação judicial, mesmo que o relator seja alguém da turma do ministro Gilmar Mendes. Sérgio Cabral FILHO sabe disso. E foi sabendo disso que aceitou a tarefa de montar e protagonizar uma farsa, cujo objetivo é desviar as atenções do principal: está em gestação o projeto mais privatizante para a exploração do nosso petróleo, com o qual o bilionário Eike Batista pretende se transformar no Nelson Rockfeller tupiniquim, tendo a seu lado o competentíssimo "consultor" José Dirceu, que já lhe prestou serviços quando Evo Morales cortou as asas da sua siderúrgica na Bolívia. Claro que, como governador atento para os interesses dos seus amigos (e seus) Cabral FILHO está juntando a fome com a vontade de comer. A possibilidade, ainda que remota, da mudança na distribuição, atingindo os contratos atuais, afetaria gravemente a implantação do Porto do Açu, em São João da Barra, município que veria os R$ 155 milhões dos royalties (70% do seu orçamento) reduzidos a R$ 620 mil, sustando todas as obras de infra-estrutura que darão suporte ao empreendimento de Eike Batista, em favor do qual o governador desterrou mais de 4 mil agricultores, cujas glebas estão agora anexadas à obra portuária do amigo. A simples possibilidade já mexe com a cotação das ações de Eike, cujos galopes fazem sua fortuna.
O chefe do protesto chegou mudo e saiu calado. Onde já se viu? - "Indignado" com a emenda fajuta, Cabral derramou-se em prantos diante dos calouros da PUC e convocou uma manifestação chapa branca tão manipulada que nela preferiu ficar calado, deixando à Xuxa e colegas deslumbrados os faniquitos de lamentos. (Onde já se viu investir num comício e não explicar o porque à multidão excitada?) Não abriu a boca porque ouviu um chega pra lá do senhor Luiz Inácio Lula da Silva, este irritado com a forçação de barra do subalterno, que extrapolou o combinado, em função de seu desejo de fazer do evento o ponto de partida de sua campanha pela reeleição. ("Não quero ouvir gracinhas", advertiu Lula. Também pudera: como explicar uma "derrota" da acachapante maioria atrelada ao Executivo?). Mesmo assim, embora o ato que uniu o Rio (segundo a máquina midiática dos Marinho) tenha juntado menos de 10% da última passeata gay, é fato incontestável que milhares de desavisados entraram na pilha do governador, com seus alarmes terroristas de falência do Estado e a inviabilização da Copa do Mundo, das olimpíadas, das aposentadorias e das unidades de polícia pacificadora (aquela intervenção que dá uma sensação de segurança no entorno de algumas favelas, embora não tenha registrado prisões dos traficantes nas respectivas áreas). Em nenhum momento, o governador e a mídia amestrada informaram que as perdas alegadas (como já disse, na contra-mão da lei e da doutrina) representam pouco mais de 10% do orçamento total do Estado - R$ 47 bilhões 403 milhões em 2010. Espalhafatoso e inseguro, dado recentemente a porres homéricos, o governador perdeu o controle da farsa e protagonizou o primeiro confronto federativo do Brasil republicano. Se agora essa "Batalha de Itararé" gerou efeitos colaterais inesperados, para o governador o importante é o sucesso em inibir qualquer outra discussão.
A devolução dos royalties aos oligopólios: essa não lhe contaram - Tanto que poucos conhecem o serviço sujo prestado pelo deputado Henrique Alves, do PMDB, relator do Projeto 5.938/09 (que Dispõe sobre a exploração e a produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos sob o regime de partilha de produção, em áreas do pré-sal e em áreas estratégicas, altera dispositivos da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, e dá outras providências). Pelo parágrafo 2º do Artigo 42 do seu substitutivo, os exploradores das nossas jazidas terão de volta em petróleo o valor que vierem a pagar como royalties. Entendeu, não? Quer dizer, enquanto Estados e municípios brigam, o deputado (que nunca foi flor de se cheirar) tratou de garantir mais grana para os oligopólios numa manobra de deixar no chinelo os lobistas que pariram a Lei 9.478/07, que abriu as pernas para as multinacionais, testas de ferro e/ou novos ricos locais (por esse monstrengo, os concessionários só abrem mão de 25% da receita bruta, em contraste com a média mundial, que é de 84% retidos nos cofres públicos dos países produtores). Isso não lhe disseram, como também ocultam o escopo da lei de partilha: por seu texto, a Petrobrás se transforma na grande financiadora da exploração terceirizada, pois tem que cobrir 40% dos investimentos em todos os poços, incluindo aí os hegemonizados pelas empresas privadas, convidadas para o banquete de R$ 10 trilhões (só do pré-sal) sem as agruras dos riscos: a "nega" já está lá dentro.
Uma guerra sob encomenda para não se falar de mais nada - Temos assim o sucesso da farsa diversionista. Estados e municípios vão para o proscênio e encenam uma guerra de fancaria, embora muito bem engendrada, com todos os condimentos emocionais que a receita prescreve. Governantes e governados esquecem antigas rusgas e vão para a guerra, segundo os figurinos medievais que excitam sentimentos de vida ou morte e levam oprimidos ao sacrifício por seus opressores. Como os estados "produtores" são minorias no Congresso e como o governador fluminense jogou com bravatas, com desesperados objetivos eleitoreiros, tem-se como favas contadas a pulverização da parte dos royalties destinados a esses entes federados e seus municípios. (Isso no formato inconstitucional do deputado gaucho, correligionário de Cabral e em fim de carreira, que, de tão exagerado, inviabiliza qualquer discussão serena e qualquer distribuição consensual, mesmo só dos novos contratos). Nesse movimento ensaiado, não se fala em mais nada, porque tudo o mais, devidamente detonado, some na penumbra letárgica, como uma espessa cortina de fumaça. O conflito real - o que opõe os interesses do Brasil à sanha dos oligopólios privados - sai de cena e dos corações e mentes dos cidadãos. Como nos velhos tempos, o populacho manipulado compra gato por lebre. Com isso, prevalece incólume o expediente dos truques e disfarces, marca indelével do governo camufladamente entreguista, montado pela super-ong de David Rockfeller, representado no topo do poder pelo banqueiro Henrique Meireles. E, enquanto a turba grita crente que está abafando, a caravana da fortuna atropela e abocanha mais um bom pedaço das nossas riquezas, ensaiando a grande festa da pernada, movida a raios multicores que desenham no espaço o desiderato do ME ENGANA QUE EUGOSTO.
Edmilson Pinheiro, São Luís/MA/Brasil