O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, desembarca nesta segunda-feira em Brasília disposto a resistir no cargo. Acossado por denúncias sobre desvio de recursos e cobrança de propina nos convênios da pasta com ONGs na área de qualificação profissional, ele avisa que morre, mas não joga a toalha. Lupi se diz vítima de retaliação de empresários que sonegariam o FGTS e o INSS no pagamento de horas extras aos trabalhadores. Ele disse que botaria “as mãos e os pés” no fogo pelo ex-chefe de gabinete e amigo pessoal Marcelo Panella, que se afastou em agosto, antes de ser acusado de cobrar de 5% a 15% do valor do contrato com ONGs para restabelecer repasses suspensos por irregularidades.
A Polícia Federal investiga, só em Sergipe, o desvio de R$ 11 milhões em convênios com o Ministério do Trabalho. O que o senhor tem a dizer sobre as denúncias?
CARLOS LUPI: Quem fez a denúncia de Sergipe foi o próprio Ministério do Trabalho, que também inscreveu as fundações como inadimplentes no Siaf. Todas tiveram o pagamento interrompido. Constatamos o problema com a CGU, que é nossa parceira. Mas isso não é dito. Existe má vontade comigo, uma herança dos tempos do brizolismo. Não me dão direito de resposta.
E quanto à denúncia da revista “Veja” sobre o envolvimento de assessores seus na cobrança de propina a ONGs?
LUPI: A reportagem da “Veja” tem um vício inicial: o denunciante se esconde atrás do anonimato. Como lutei contra a ditadura, é duro assistir. As organizações citadas, Oxigênio e Instituto Êpa, não chegaram a receber o dinheiro. O ministro Garibaldi Alves, da Previdência Social, realmente me procurou para conversar sobre a Êpa. Mas expliquei a ele que não havia como liberar os repasses. Só saiu a primeira parcela, o que é normal.
O afastamento do coordenador-geral de Qualificação, Anderson Alexandre dos Santos, um dos acusados, indica que a denúncia tem consistência?
LUPI: Pedi ao Anderson, que trabalha há oito anos no Ministério, que saísse para que pudéssemos apurar as denúncias. Ele é um cara humilde. Está em depressão.
Outro citado, Marcelo Panella, seu chefe de gabinete, também saiu em agosto passado por causa das suspeitas?
LUPI: Marcelo me pedia desde o ano passado para sair. Ele tem um filho de 10 anos e pavor de viajar de avião. Está esgotado. Por ele, ponho os pés e as mãos no fogo. Nós nos conhecemos há 25 anos. Sou seu padrinho de casamento. Atendendo a seu pedido, eu o exonerei. Ele e Anderson são os mais atingidos com as denúncias. Foram jogados na lama sem direito de defesa. O Ministério do Trabalho tem 10 mil funcionários e 600 unidades descentralizadas. Pode ter erro? Pode. Falhas? Também. Mas corrupção é difícil.
Se o próprio Ministério denunciou convênios à polícia, o senhor admite que havia problemas com os recursos repassados às ONGs?
LUPI: Até dezembro de 2007, o governo não fazia chamada pública para contratações de ONGs. Até então, bastava apenas apresentar o projeto. Se aprovado, era executado pela própria organização. O pagamento saía na medida em que o serviço era prestado. Esta fórmula, que predominava até a minha chegada, causava problemas de fato. O que não pode é generalizar, como se todos fossem bandidos.
Depois que o senhor entrou, o que foi mudado?
LUPI: Quando cheguei, implantei a chamada pública. Não é concorrência oficial, mas prevê edital, pregão e escolha do menor preço. Desde o início do ano, não fazemos mais convênios com instituições sem fins lucrativos. Falta-nos pernas para fiscalizar, investigar in loco. Assim, fica difícil controlar. Os convênios, agora, são feitos com estados e municípios. A responsabilidade passou a ser deles.
O senhor disse que já agiu no caso das ONGs de Sergipe. E o caso das propinas?
LUPI: Pedi ao ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) a abertura de inquérito na Polícia Federal para investigar as denúncias da “Veja”. Ninguém pode ter a honra jogada no lixo por causa de uma denúncia anônima. Também notifiquei judicialmente o Ministério Público para que faça a sua apuração. Não sou conivente com desvios éticos. Se isso ocorrer, o que não acredito, o responsável terá de pagar. Vou fundo. Tenho 30 anos de partido e ganhei muitos inimigos.
O senhor pretende deixar o Ministério do Trabalho?
LUPI: Estou no vespeiro. Vou nesta luta até o fim. Descarto totalmente a renúncia. Morro, mas não jogo a toalha. Alguns nascem para se acovardar. Outros, para lutar. É o meu caso. Topo a luta. Vou até o fim.
Contra quem o senhor luta?
LUPI: Por trás das denúncias, há o dedo daqueles que ficaram insatisfeitos com a implantação do ponto eletrônico no país. Constatei que existia uma fraude no descontrole da frequência dos trabalhadores. Muitas empresas pagam a hora extra, mas não recolhem FGTS e INSS. Com o ponto, o ministério passa a enfrentar essa sonegação. Mexi com poderosos inimigos. Atirei no que vi e acertei no que não vi. Agora, esses caras me escolheram para derrubar.
O Globo
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